Livraria Lello: Charme e Cultura no mesmo espaço

A Livraria Lello é um ponto de referência, quer a nível nacional, quer a nível internacional. Recentemente começou a ser mais falada pelos meios de comunicação e isso fez com que o número de visitantes aumentasse.

Matilde Lindberg. Assumiu a função de coordenadora turística da livraria em novembro de 2015, um período marcado por grandes alterações, como a nova administração, revisão do cronograma empresarial e expansão da equipa. “Estamos em plena fase de rebranding de comunicação, nova programação cultural, entre muitas outras mudanças”, afirma a responsável. Segundo a funcionária, “parte da Livraria foi reestruturada em 1995, criando-se condições que permitissem acomodar os escritórios. Em 2015, a Livraria passou a ser explorada por uma Sociedade, constituída pelo Sr. José Manuel Lello, bisneto de um dos fundadores da Livraria (José Lello), e por Pedro Pinto”.
Mas afinal de onde vem tanto relevo?

110 anos de história
A 13 de Janeiro de 1906 abre a Livraria Lello. Criada pelos irmãos José e António Lello. Estes dois homens nasceram na Casa Ramadas, freguesia de Fontes, em Santa Marta de Penaguião. José Lello foi o primeiro dos irmão a vir para o Porto e era um homem da cultura, amante de livros e de música. Tinha como sonho tornar-se livreiro e realizou-o quando abriu a primeira livraria e editora em 1981 com o seu cunhado.

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Fachada da livraria

Aquando a morte deste, o irmão de José, António Lello, 9 anos mais novo, juntou-se a ele e constituíram a sociedade José Pinto de Sousa Lello & Irmão.
Existe desde 1906 e desde essa altura que tem um papel muito importante para todos. Já foi inspiração para escritores famosos e palco de várias tertúlias. Atualmente recebe visitantes de todo o mundo, que não desperdiçam a oportunidade de visitar a livraria de estilo neogótico dos inícios do século XX. Foi contruída pelo engenheiro Francisco Xavier Esteves (1864-1944). Além de Livraria Lello é também conhecida como Livraria Chardron, ou Livraria Lello & Irmão e situa-se na rua das carmelitas 144 na freguesia Vitória da cidade do Porto.
A terceira mais bela livraria do mundo
O seu interior além dos livros, que são considerados por todos como verdadeiras preciosidades, sobressai a escadaria e o vitral existente no teto. Quem lá entra é como se fizesse uma viagem no tempo, entre o passado, o presente e o futuro. É considerada por muitos como sendo um culto às artes.

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Foi considerado como um monumento de interesse público em 2013. São mais de 120 mil obras expostas por toda a livraria, desde as prateleiras ao “chão”. Nela existem obras bastante raras e antigas que estão guardadas em prateleiras altas e protegidas com vidro.
A Livraria Lello já foi várias vezes mencionada como uma das livrarias mais cool em 2015 para a revista Time e para a CNN, referindo-se à livraria como sendo a mais bela do mundo. O objetivo com a construção da livraria, tanto no interior como no exterior, seria deixar todas as pessoas espantadas.
A vida da escritora J.K Rowling na cidade do Porto
A Livraria Lello serviu de inspiração para escritora Joanne Rowling. Inspirou-se principalmente pelas escadas que dão acesso ao piso superior da livraria.
Entre 1991 e 1993 J.K Rowling dava aulas de inglês na Encounter English no Porto, onde dividia casa com mais duas professoras Jill Preweet e Aine Kiely, a quem dedicou o terceiro livro da saga: Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban.
A determinada altura conhece um jovem rapaz num bar, de nome Jorge Arantes. Houve interesse de ambas as partes e em poucos anos, de 1992 a 1995, se casaram e divorciaram.

Retrocessos ou progressos?
Desde que foi inaugurada, milhões de turistas visitam a cidade do Porto todos os anos. Em 2014, dois milhões de turistas passaram pela cidade, algo impensável para os criadores da livraria, José e António Lello que se hoje fossem vivos estariam mais do que orgulhosos com a sua criação. De igual forma, também ficariam espantados com o desenvolvimento das tecnologias, nomeadamente o aparecimento da internet, que permite a publicação e a partilha de todas as informações acerca da livraria que tanto gosto lhes deu construir.
Atualmente é muito comum que os turistas e locais visitem a livraria. Repleta de livros e de bustos de importantes com figuras do mundo da escritura como por exemplo de Eça de Queiroz, Antero de Quental, Tomás Ribeiro entre outros. Em 1981 foram adicionados os bustos de António e de José Lello, para permitir aos visitantes que vissem os criadores da livraria que tanto interesse/curiosidade lhes despertou.

Inauguração
A livraria foi construída em menos de dois anos por Francisco Xavier Esteves. Para a fachada a inspiração foi o Mosteiro da Batalha.
Ao que consta a inauguração foi um grande acontecimento na cidade. Entre as 12h e as 13h apareceram personalidades importantes, desde de homens das letras, políticos, artistas, entre outras personalidades. No dia seguinte à inauguração, o jornal ocidente dava a notícia da mesma dizendo “As letras em Portugal já têm um templo”; já o jornal de notícias dizia que a Lello ficaria para sempre como um dos edifícios mais belos do país.
Para entrar

Desde Julho de 2015 que a livraria vem causando alguma discórdia, devido ao facto de ter começado a cobrar entrada aos visitantes: três euros por pessoa. Apesar de ter sido uma medida drástica foi a única e melhor solução possível.

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Entre quatro a cinco mil pessoas por dia que nada valorizavam o espaço onde estavam, no entanto, e após esta medida, os resultados só são positivos. Claro que houve uma baixa de afluência, cerca de 2400 pessoas por dia no verão e 1400 no inverno, altura em que os turistas na cidade do Porto também diminui.

O facto do número dos visitantes ter diminuído acaba por responder com aquele que era o principal objetivo dessa medida: o fazer com que o espaço estivesse mais calmo.
O dinheiro da entrada é convertido num vale que pode ser utilizado na compra de livros, e assim não pagar o valor total do mesmo por já ter aqueles três euros da entrada. Com esta medida a venda de livros aumentos drasticamente, e muitos visitantes não querem sair sem comprar um livro ou algo que lhes faça ficar na memória que algum dia já estiveram numa das mais bonitas livrarias do mundo.

Matilde Lindberg refere que “O número de visitantes continuou a aumentar. Por diversos motivos: divulgação da Livraria como uma das mais bonitas do mundo, a sua associação ao fenómeno literário de Harry Potter, a popularização do destino turístico Porto, a inauguração do Porto de Leixões, entre outros. A grande diferença foi que as pessoas começaram efetivamente a comprar livros, já que os vouchers podem ser descontados em livros. Conseguimos realizar a nossa missão de transformar cada turista num leitor. Estes vouchers ajudaram a que as pessoas comprassem mais livros, além de que a nossa oferta procura englobar um perfil turístico cada vez mais amplo, nas mais diversas nacionalidades.”

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Para os interessados
A viagem de Viseu até ao Porto demora cerca de uma hora e quarenta e cinco minutos. Chegando ao destino, a livraria fica a não mais de 15 minutos a pé. Quando se chega ao pé da livraria é imediatamente visível a quantidade de gente na fila à espera de comprar o bilhete para entrar e, depois, essas mesmas pessoas esperam para poderem ir para o interior. O custo do bilhete é de três euros e, esse dinheiro, caso se compre algum livro, é descontado no valor desse produto.

Quando se entra na livraria é logo possível ter a perceção da beleza e da arquitetura magnífica que tanto a caracterizam. A verdade é que qualquer pessoa que lá entre não consegue ficar indiferente quer seja pela escada, que é dos elementos que mais se destacam, quer seja pelo vitral ou até pela quantidade/variedade de livros que a biblioteca tem para oferecer, porém, e como é natural, os livros mais antigos e raros estão protegidos num vitral para que não sejam deteriorados nem desgastados.

Neste momento a fachada da livraria encontra-se em reconstrução, pelo que não é permitido vê-la. Alguns turistas mostram desagrado porque a parte exterior é tão elaborada quanto o seu interior.

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A Livraria Lello “foi classificada como Monumento de Interesse Público pelo Património Cultural, e considerando a atual carga turística, existe a uma grande preocupação para com a manutenção e preservação deste edifício, único no mundo. As atuais obras de restauro contemplam a fachada, com o intuito de se recuperar a sua cor original, e o vitral, no interior, com término no início de Julho. Numa fase posterior, terão início os trabalhos de restauro no interior da Livraria”, afirma Matilde Lindberg. Tudo foi pensado e construído com o objetivo de marcar as pessoas de alguma forma.

No interior, destaca-se a quantidade de livros que está exposta nos armários e nas bancadas, a escadaria, e também, a secção que tem artigos da própria livraria, como canecas, blocos de notas, entre muitos outros artigos. No piso superior, é possível ver-se o vitral, além de uma espécie de mini café/bar onde as pessoas se podem sentar e consumir alguma coisa, como um café, por exemplo. É possível sentar-se num sofá e estar descansado a ler um livro ou simplesmente deixar-se descontrair e deixar-se envolver com todo aquele espaço.

As opiniões
Quisemos saber qual a opinião das pessoas que estavam prestes a entrar na livraria. Todos os entrevistados referiram que o que os motivou a ir visitar a livraria era o facto de aparecer em todos os mapas com os pontos mais importantes da cidade do Porto, João disse-nos: “não houve um único roteiro turístico da cidade que não tivesse esta livraria como ponto de referência, tive de vir ver com os meus olhos”. Sendo uma das livrarias mais bonitas do mundo, os visitantes referiram que só pagavam a entrada por esse mesmo motivo, pelo facto de ser uma livraria que tinham a certeza que ia valer a pena visitar.

“Tenho pena que agora a entrada tenha de ser paga, das outras vezes que aqui vim era grátis. Enfim, temos de nos sujeitar, quem não quer pagar não visita”, sustenta Alexandra. Também a jornalista brasileira, Naira Andrade, se encontrava na fila para entrar na livraria. De acordo com a turista, a sua visita foi motivada por “admirar tanto arquiteturas diferentes”. “Além disso, como jornalista que sou adoro livrarias e juntar isso com um estilo que eu adoro não podia ser melhor”, revela.

Para as pessoas locais o facto de a Livraria Lello ser um ponto de referência da cidade enriquece-a imenso, mas, segundo alguns testemunhos a cidade está-se a deixar levar por isso e a tornar tudo pago, ou seja, apenas a querer vender, sem pensar nas pessoas que já lá vivem e que gostariam de, de vez em quando, visitar certos sítios sem pagar. “Tenho medo que a cidade se esteja a perder. Já não encontro nem as pessoas tão características da cidade nem aqueles sítios tão pouco frequentados. Sinto falta disso”, lamenta Alexandra.

Um café próximo, nas galerias Lumière, não sente esse aumento. Têm uma maior afluência de clientes no verão devido aos hostels que estão perto, mas não sentem esse aumento devido à sua localização relativamente próxima da livraria.

Estará a livraria a fazer com que a cidade do Porto se perca?
Esta livraria é capaz de marcar a memória de qualquer pessoa que a visite. É um edifício muito bem construído a todos os níveis, de tal forma que a esmagadora maioria das críticas que se leem sobre o espaço não podiam ser melhores. É um dos locais que recebe mais visitantes diariamente na cidade do Porto, dado o facto de estar tão bem publicitado, e de chegar tão facilmente às pessoas provenientes de vários sítios.

Depois de mais de um século de existência, a Lello encontra-se no seu auge: mesmo cobrando entrada as pessoas visitam o edifício à mesma, as receitas estão a ser suficientes para manter a livraria, existe uma forte adesão na compra de livros devido aos vouchers dados no ato de pagamento para entrar, existe uma forte diversidade cultural, entre muitos outros fatores. Passe o tempo que passar, não vai ser esquecida nem deixar de ser um ponto de referência tanto a nível cultural como a nível turístico. A verdade é que o nível de reconhecimento que conseguiu atingir não vai, desaparecer por muito que o mundo mude. O facto de não ser uma livraria comum ajuda no facto de despertar mais a curiosidade das pessoas.

Para os turistas este é, quase obrigatoriamente um local a visitar. Os habitantes gostam de ver a sua cidade enriquecer, tanto a nível de cultura como económico. Claro que o medo da cidade se tornar demasiado urbanizada, ou demasiado “vulgar” vai existir sempre, e com o passar do tempo é algo que não é possível lutar, referem. Pensam apenas que nunca desaparecerá totalmente e existirão sempre aqueles sítios mais característicos, mais sossegados, que nenhum turista chegará, é o que os locais esperam.

Por ser um local visitado por tanta gente é impossível que agrade a todos. “Numa casa visitada diariamente por milhares de pessoas, é natural que já tenhamos recebido várias críticas negativas. Basta consultar o Trip Advisor, por exemplo. As principais estão relacionadas com o facto de a considerarem sobrelotada, alguns não concordam com o facto de cobrarmos entrada, apesar de poder ser descontada, entre outras”, salienta Matilde Linberg,

Esta livraria, agradando a todos ou não, não vai deixar de ser visitada. Segundo Bruno, “é uma livraria intemporal, não vai deixar de ser visitada devido à
beleza que tem. Não penso que vá deixar de ser um ponto de referência quer a nível turístico quer a cultural”.

Podemos dizer que esta não passa despercebida a ninguém que por lá passe, e mesmo que não conheça, visita nem que seja pela curiosidade. “Não conhecia esta livraria, vim visitar por causa da fila que estava lá fora, pensei que tinha de vir ver por mim qual o motivo que levava tanta gente a visitar uma livraria. Agora já percebo”, referenciou Alberto. Tal como este visitante, todos os outros disseram que é um local que vale muito a pena visitar e não deviam deixar de lá entrar para cada um experienciar por si.

Andreia Vale (texto e fotos)

 

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