Qual a cor da liberdade?

Foi em tom musical e teatral que, na passada terça-feira, dia 25 de abril, se celebrou o Dia da Liberdade com a declamação de poemas, na Biblioteca Municipal de Viseu. O evento ficou na memória das pessoas que viveram esse dia, há 44 anos.

O espetáculo caracterizou-se por ser uma fusão entre o teatro e a literatura, através da declamação de obras de vários poetas. A preparação para o mesmo, que percorre vários pontos do país, durou cerca de um mês e meio.

A peça também se distingue por um elevado tom de dramatismo, que foi propositado pelos atores. O uso de sons que se assemelhassem a sons de guerra foram fundamentais para transportar o público para um cenário de batalha. Ao longo da sessão declamaram-se obras de Manuel Alegre, Ary dos Santos e Fernando Pessoa, bem como trocas de cartas entre Álvaro Cunhal e Maria Eugénia. Tal como Jorge Sena, outro dos autores abordados, escreve no seu poema “Cantiga de Abril”, os atores demonstram que a cor da liberdade é “verde e vermelha”.

Esta iniciativa partiu das mãos de Luís Geraldo e Lita Pedreira, dois atores que se formaram no Conservatório Nacional da Escola Superior de Teatro e Cinema em Lisboa. A ideia surgiu a partir de uma experiência, não tão elaborada, dos atores, no Teatro Nacional D. Maria II, com leituras encenadas, que obteve uma boa resposta por parte do público, em termos de consumo de livros e hábitos de leitura.

Depois disto, o percurso dos atores tornou-se mais claro e criaram, então, este projeto itinerante. A principal característica deste espetáculo é a adaptabilidade a vários espaços. Como tal, vai ao encontro das comunidades, dos teatros, das bibliotecas, dos museus e das livrarias.

“Memórias de Abril” também conta com uma forte presença musical e sonora. Vários dos sons ouvidos no espetáculo foram produzidos pelos atores, que recorreram a materiais como garrafas de cerveja e copos de cristal.

A temática deste feriado nacional também foi escolhida porque, apesar de não terem vivenciado aquele momento, ambos tiveram familiares que sofreram bastante com o período do Estado Novo.

Um dos principais objetivos da peça foi também atrair o público mais jovem, que parece cada vez mais afastado do período do Estado Novo. Os atores consideram que é importante este passado não ser esquecido, para que não se repita e que os cidadãos se devem tornar mais ativos e informados.

O espetáculo foi considerado denso, inclusive pelos protagonistas da peça. A ideia era criar um ambiente que se assemelhasse a um cenário de guerra. Luís Geraldo observa que nunca conseguirá sentir na pele o que aquelas pessoas viveram há mais de 40 anos.

O final da peça dá-se com uma referência à situação atual de Portugal. Lita Pedreira afirma que “a ideia do espetáculo não é que as coisas tenham terminado em bem, daí a parte final da peça fazer alusão aos problemas atuais do nosso país”. Luís Geraldo acrescentou: “Muita coisa mudou mas há muita coisa que tem de ser mudada”.

A sessão encerrou com a oferta de cravos a todos os intervenientes, incluindo o público, ao som de “Grândola, Vila Morena”, de Zeca Afonso.

 

Texto: João Almeida e Susana Sousa

Imagem: Susana Sousa

a