Maçã de Montanha de Armamar: “A fonte económica do concelho”

Armamar, um pequeno concelho do distrito de Viseu, que conta com pouco mais de cinco mil habitantes, situa-se na região do Alto Douro Vinhateiro. Esta localidade distingue-se maioritariamente pela famosa produção de maçã de montanha, vinhos do Douro, fumeiros e queijos. A maçã é rainha e o principal setor primário do concelho, por este motivo Armamar é conhecido como ‘Capital da Maçã de Montanha’.

Reportagem de Diana Teixeira

Com vista para os extensos pomares de macieiras que rodeiam o município, Armamar é reconhecido a nível nacional como um dos maiores produtores nacionais de maçã, e é esta a grande fonte de rendimento de muitas famílias, das várias freguesias que compõem o concelho.

Devido à crescente produção deste fruto, no dia 24 de fevereiro de 1994 nasce a Associação de Fruticultores de Armamar (AFA), presidida por José Osório. Esta entidade surge com o objetivo de “investigação, na experimentação, e divulgação de todas as ações técnicas e económicas visando o melhoramento da fruticultura e a formação profissional dos seus membros, assim como receção de candidaturas a ajudas aos produtores e no apoio técnico aos associados da associação”, como refere o presidente da Associação.

Vítor Paiva, engenheiro agrícola da AFA, conta que desta já fazem parte 240 associados, que trabalham em parceria com a entidade. O responsável esclarece ainda que o produto criado na região não se trata apenas de um fruto, mas sim de um fruto de montanha: “A designação “Maçã de Montanha”, conferida ao fruto produzido no concelho, é a mesma patenteada desde 30 de Dezembro de 1997, pela empresa Pomar d ́Ouro”.

Ser produtor de maçã em Armamar

Para se ser produtor de maçã em Armamar é preciso cumprir com determinados requisitos e o principal é ter uma área própria ou alugada no concelho, com características específicas de solo e clima. Para implantar um pomar, é necessário investir um valor que ronda os 30 mil euros por hectare. Este valor, apresentado por Vítor Paiva, já inclui todos os equipamentos e tratamentos necessários ao solo e pós-plantação das respetivas árvores de fruto. Segundo este “há um outro conjunto de tratamentos a ter em conta após a constituição do pomar e esses têm um custo médio total de 7 mil euros”. Este valor representa um hectare, que contará com uma futura produção de cerca de 60 mil quilos de maçãs por ano.

De Armamar já fazem parte 300 fruticultores e, ainda que este número tenha vindo a diminuir nos últimos anos, o número de área produzida, por sua vez, tem vindo a crescer. Estas 300 pessoas fazem da produção de maçã a sua vida, os lucros correspondem ao seu rendimento familiar e é através dos valores adquiridos que sustentam os seus.

A campanha inicia-se em Agosto, e são muitos aqueles que aproveitam esta época para trabalhar na chamada “apanha da maçã de montanha” que se prolonga até meados de novembro.

Começa-se por apanhar as variedades mais precoces, como é o exemplo da variedade Royal Gala, e termina-se com a variedade mais tardia, as Fuji. Questionado sobre a quantidade média de maçãs que um trabalhador deve apanhar por dia, Vítor Paiva dá- nos uma estimativa de 900 a 1000 quilos. Já em relação ao processo de pagamento, feito a todos aqueles que trabalham durante esta campanha, o engenheiro agrícola responde:

“Calculando que um hectare de pomar moderno produz, num ano normal, cerca de 60.000 kg, seriam teoricamente necessárias 60 pessoas para apanhar esse hectare em apenas 1 dia. Calculando que a mão-de-obra tem um custo diário de cerca de 40,00 € por trabalhador, por dia, teremos um custo médio de colheita total de 2.400,00€ por hectare, o que perfaz um custo por kg de 0,04€. Se adicionarmos o transporte chegaremos a cerca de 0.05 a 0,06 € por kg”.

Vítor Paiva, engenheiro agrícola

Maçã de Armamar é apreciada em vários pontos do globo

Durante o momento da apanha é feita a primeira grande seleção. Esta resume-se por deixar no chão a maçã com defeito ou que se apresente com calibre abaixo dos 60mm equatoriais, uma vez que, no final da apanha da maçã comercializável em fresco, é recolhida para venda imediata ao mercado industrial de concentrados, desidratações, purés ou sumos. As restantes, a fruta classificada como “em bom estado”, é apanhada e levada de imediato para as câmaras de frio. Mais tarde, e ainda reservadas nas câmaras, começa o processo de calibragem, seleção, classificação e finalmente de embalagem. Após o último processo, e de modo a terminar a campanha, as maçãs são levadas até aos seus destinos. “Há três mercados de venda: mercados tradicionais, mercado da grande distribuição e mercado da exportação. Logicamente a qualidade do produto varia em ordem crescente relativamente aos mercados referidos”, explica José Osório.

O concelho de Armamar produz, num ano normal, cerca de 75 mil toneladas de maçã, numa área de cerca de 1.800 hectares, o que representa cerca de 30% a 35% de toda a produção nacional. O presidente da AFA explica que “se a estes valores juntarmos toda a região Douro-Sul, que envolve também os concelhos vizinhos, estaremos próximos de uma produção na ordem das 120 mil toneladas, o que se aproxima dos 50% de toda a produção de maçã do país”.

Quanto ao mercado da exportação, este “tem crescido significativamente e em breve irá representar uma fatia importante no mercado total da maçã da região. Se há 10 anos atrás era um mercado insignificante hoje representa garantidamente mais de 20% de todas as vendas regionais”, acrescenta José Osório.

São vários os países com interesse neste produto. Para além de alguns países europeus, como é o caso essencialmente de Espanha e de Inglaterra, são os países da América do Sul, como o Brasil e o Chile, que mais procuram a importação de maçã produzida em Armamar. Sobre a exportação realizada para estes locais, Vítor Paiva realça: “não temos fiabilidade suficiente para poder dar números sobre as quantidades exportadas, no entanto a exportação tem uma grande vantagem: independentemente das quantidades produzidas e da elasticidade dos preços, por haver mais ou menos produção, os preços encontram, neste mercado, um preço sensivelmente constante e acima do preço do mercado interno em anos de produção normal”.

2020: Um ano difícil

Podíamos falar de 2020 como mais um ano normal, infelizmente, para a população em geral, não foi o que aconteceu. Falar do ano que passou, é falar num cenário de terror e os fruticultores de Armamar, assim o reconhecem.

Ainda que a Covid-19 tenha vindo colocar um travão no mundo, nomeadamente na economia, os fruticultores não mostraram qualquer desagrado, a nível económico, face à atual situação pandémica. “Não há dados que nos permitam ter uma noção do real prejuízo desta pandemia na produção de maçã, mas não foi significativo. Trata-se de uma atividade ao ar livre que não se viu ser suspensa por força legal nos momentos de confinamento”, confirma José Osório.

O principal motivo de preocupação do último ano, por parte daqueles que exercem esta profissão, foi o clima. José Osório relembra o último ano como um dos piores e relata: “Um dos grandes problemas da região nos últimos anos tem sido, sem dúvida, a queda de granizo, muitas vezes em anos consecutivos. Nesta última campanha verificou-se uma quebra de cerca de 70% da produção, na sequência da queda de granizo. Ou seja, perderam-se mais de 50 toneladas para venda em fresco, e a esmagadora maioria foi encaminhada para a indústria, com perdas muito significativas no preço final”.

Queda de granizo

Os relatórios finais da campanha de 2020, mostraram que o preço médio de venda da maçã industrial rondou os 10 cêntimos, enquanto que o preço da maçã de venda em fresco não ultrapassou os 45 cêntimos. “Verificámos um gap de 35 cêntimos, o que representa em termos de prejuízo bruto na produção total da região de mais de 17 milhões”, clarifica o presidente da Associação.

Ninguém estava preparado para esta corrente de mau tempo que assolou a região de Armamar, no entanto, estes “fruteiros”, nome por que são conhecidos na localidade, foram os mais afetados. José Osório admite que foram apanhados de surpresa e que a entidade não tinha programado nenhuma estratégia que viesse a combater o granizo. “O que salvou os fruticultores foi o seguro de colheitas, que minimiza o prejuízo, mas é cada vez mais caro e menos eficaz”, afirma o presidente da AFA.

Sistema promete agir face a condições atmosféricas adversas

Como forma de precaução para a campanha que irá decorrer este ano, a Associação já reuniu e definiu objetivos a cumprir, para que possíveis quedas de granizo não venham, novamente, estragar a produção de maçã em Armamar.

“Numa União na Proteção Contra o Granizo (UPCG), a Cooperativa Agrícola do Concelho de Armamar, em consonância com a Associação de Fruticultores de Armamar, e preciosa colaboração da Câmara Municipal, tomaram a iniciativa de se unirem num projeto de alcance regional que visa minimizar os prejuízos provocados pela queda de granizo que, ao longo dos anos, tem afetado o concelho”, revela José Osório.

João Paulo Fonseca, presidente da Câmara Municipal de Armamar, reconhece a importância desta união de forças no combate aos problemas causados na produção deste fruto e afirma que “na campanha passada, cerca de 80% da área de produção de maçã, que foi afetada, está destruída. Falamos num número de 1.100 hectares afetados, nomeadamente 45mil toneladas de maçã. Estes valores representam um prejuízo na ordem dos 8 milhões”. O autarca não deixa de alertar que: “A maçã é a grande fonte económica do concelho. Esta quebra prejudicou diretamente os fruticultores, mas acabou por afetar toda a economia regional”.

João Paulo Fonseca, presidente da Câmara Municipal de Armamar

O projeto, pensado em várias parcerias, consiste na instalação de 55 sistemas de proteção contra a precipitação de granizo. Cada sistema, conferido com uma eficácia de 95%, tem um raio de proteção de 80 hectares, cobrindo uma área circular de 1Km de diâmetro. Sobre a instalação do novo sistema pensado para combater futuras quedas de granizo, Vítor Paiva afirma que “estão perfeitamente adaptados às necessidades do sistema cumprindo com todas as medidas de segurança”. Paralelamente, a esta decisão, foi também integrado um sistema de radar de análise e deteção das nuvens potencialmente geradoras de granizo. Este é capaz de monitorizar, em tempo real, o estado da atmosfera e ativar os sistemas de proteção, sem que haja necessidade de intervenção do fator humano.

Quanto aos custos que estas medidas acarretam, os números da AFA mostram que, numa primeira fase, verificou-se o investimento efetuado de cerca de 2 milhões de euros em 55 canhões. Estes estarão a ser distribuídos pelos agricultores, de forma a abranger toda a área de pomar. Num segundo momento, dá-se o chamado payback do investimento. O engenheiro agrícola explica que “é preciso salvaguardar todos os custos inerentes ao funcionamento e manutenção do equipamento, bem como a recuperação do capital tendo em atenção as prestações pagas por cada agricultor, com base em 1 hectare”.

Com o desejo de um ano melhor, face ao clima, a AFA prevê que o sistema de canhões esteja pronto no final do mês de fevereiro.

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