“Ocupar o lugar de maestro na banda onde tudo se inicia musicalmente, é especial para qualquer um”

Rui Lima, de 32 anos, é o atual maestro da Associação Filarmónica de Tarouca e docente na Academia de Música de Tarouca. Nesta entrevista, revela o seu percurso musical, desde os primeiros contactos com a música, o seu período no Exército, a sua passagem pelo Conservatório Nacional do Porto e na Universidade do Minho e até dos cursos de direção de banda que frequentou. Fala das suas experiências como músico e da aprendizagem com músicos de renome nacional e internacional até atingir àquilo que é hoje enquanto músico. Explica ainda como surgiu o projeto musical “Ar de Rastilho – Fanfare Band”, onde está inserido, e a “Orquestra de Sopros Vale Varosa”, da qual é um dos fundadores, bem como que objetivos tem em vista para alcançar em ambos os projetos musicais onde está inserido e também que pretende realizar com a Associação Filarmónica de Tarouca no futuro.

 

Com que idade iniciou os estudos musicais e o que o levou a escolher trombone de varas como instrumento?

Rui Lima Iniciei os meus estudos musicais relativamente tarde, com 14 anos de idade. Na época não eram os alunos que escolhiam o instrumento, mas sim o professor. No meu caso foi o senhor José Lopes que me indicou o trombone.

 

Quando iniciou os seus estudos musicais já ambicionava tornar-se músico profissional?

RL Quando iniciei os meus estudos musicais não. Essa ambição veio, cerca de três anos mais tarde, quando percebi que era isto que realmente gostava de fazer.

 

 Aos 19 anos entrou para o exército. De que maneira isso influenciou a sua vida a nível musical e pessoal?

RL A minha entrada no Exército influenciou claramente o meu trajeto musical. Deu-me a oportunidade de ter tempo necessário para estudar. Ganhei muitos conhecimentos na área e embora, pessoalmente, tenha mantido a mesma personalidade o status mudou. Senti que as pessoas, em geral, começaram a ter mais respeito por mim.

 

Durante o seu período no exército, tocou na Banda Sinfónica do Exército e na Banda Militar do Porto. Esta experiência trouxe-lhe melhorias enquanto músico?

RL Sim, bastante. O contacto constante com músicos profissionais obriga-nos, quase sem querer, a melhorar no dia a dia. É um absorver de experiências musicais, de repertório novo, que nos motiva a ser melhor.

 

Depois de terminar o seu período no exército, o que o motivou a ir estudar para o Conservatório Nacional do Porto e para a Universidade do Minho?

RL O meu período no Exército não passou disso mesmo, apenas um período de aprendizagem. Nunca foi minha intenção fazer carreira como músico militar. O que me motivou a estudar no Conservatório e na Universidade foi ganhar conhecimento e assim, poder regressar à minha terra com alguma bagagem, para partilhar.

 

Ao longo desse tempo trabalhou e estudou com conceituados trombonistas nacionais como Joaquim Raposo, David Silva, Kevin Hakes. Que aprendizagens e conselhos retirou destes profissionais?

RL Tive o privilégio de trabalhar com alguns dos melhores trombonistas, nacionais e internacionais, uns mais tecnicistas, outros mais musicais, outros com conceitos musicais um pouco diferentes do “normal”, mas o mais importante, que acho que consegui, foi extrair o melhor de cada um.

 

Após ter terminado os seus estudos no Conservatório Nacional do Porto e na Universidade do Minho resolveu frequentar dois cursos de direção de banda, na Banda de Amarante. O que o motivou a frequentar estes cursos de direção de banda?

RL O que me motivou a frequentar os cursos de direção foi, no primeiro, sobretudo, a curiosidade. Conhecer a sensação de dirigir pessoas que dependem do teu gesto para fazer boa ou má música. No segundo curso de direção foi para adquirir mais técnica, mais experiência e aprofundar conhecimentos. Espero não ficar por aqui.

 

Ao frequentar estes dois cursos de direção de banda teve a oportunidade de trabalhar com aclamados maestros nacionais e internacionais, como Avelino Ramos, Paulo Martins, Alexandre Coelho, Eugene Corporon, Jouke Hoekstra, Jan Cover. Que ensinamentos e conselhos é que eles lhe passaram?

RL Tive a sorte de trabalhar com alguns dos melhores maestros da atualidade e penso que consegui tirar, para mim, o melhor de cada um. Conceitos musicais, técnicas de ensaio, ver a música para além de simples notas escritas, questões de liderança. Tudo isso é importante num maestro.

 

Rui Lima durante o concerto Missa Brevis de Jacob de Haan

 

É membro da “Ar de Rastilho – Fanfare Band!”, como surgiu esse projeto musical?

RL Este projeto nasceu em 2011, quando um grupo de amigos, todos estudantes de música, decidiram juntar-se e por em prática tudo o que aprenderam.”

 

Quais são as principais influências musicais do projeto?        

RL É um projeto que tem na sua génese musical uma grande diversidade de estilos e linguagens. Tem como principal objetivo a criação de temas originais por parte de cada um dos seus músicos, todos eles com características musicais muito próprias.

 

No passado ano de 2017 lançaram o segundo CD intitulado de “Mão de Ferro”, para o futuro pretendem lançar mais algum CD?

RL Depois do sucesso do primeiro e segundo Cd´s, estamos um pouco em standby. Cada um de nós tem a vida muito agitada o que nos impede, para já, de continuar o trabalho.

 

Também faz parte da “Orquestra de Sopros do Vale Varosa”. Como e com que intuito surgiu esse projeto do qual é um dos fundadores?                           

Esta orquestra surge, também, com um grupo de amigos, no intuito de proporcionar aos músicos do concelho de Tarouca a oportunidade de poder tocar repertório diferente do habitual, repertório de orquestra de sopros, fora do ambiente filarmónico.

 

A “Orquestra de Sopros do Vale Varosa” já realizou dois estágios de Orquestra de Sopros nos anos de 2016 e 2017, pretendem realizar um terceiro estágio este ano?                                                                                

RL Sim. Este ano,2018, vamos ter o terceiro estágio da Orquestra de Sopros do Vale Varosa.

 

Que balanço faz acerca dos dois estágios realizados no concelho?                      

RL Faço um balanço muito positivo. Positivo para os músicos, que têm a oportunidade de trabalhar com maestros de renome e professores bastante conceituados no panorama musical nacional, positivo para as filarmónicas, positivo para os maestros que sentem a energia positiva que trazem do estágio, positivo para o comércio local e positivo para a terra em si. É um estágio que começa a atrair cada vez mais alunos de fora da terra o que dinamiza também o concelho.

 

De que forma estes estágios ajudam na evolução de um músico?

RL O nosso estágio tem também a vertente de masterclass de instrumento integrado. Desta forma os músicos podem evoluir muito mais depressa. Têm contacto com maestros diferentes do que o habitual, repertório diferente e até mais motivador, aprendem a respeitar o colega do lado, mesmo que não o conheça, ganham bons hábitos, no que diz respeito à disciplina, aprendem a tocar em grupo, aprendem a respeitar horários e sobretudo aprendem a respeitar o trabalho dos outros. Quando não têm ensaio de orquestra estão ocupados a ter masterclass, onde podem aperfeiçoar técnicas e ganhar novos conhecimentos.

 

Desde outubro de 2014 que é maestro da Associação Filarmónica de Tarouca. Esperava algum dia chegar a maestro da banda onde iniciou os seus estudos musicais?

RL Na verdade, e a partir de uma certa altura da minha carreira musical, achei que tinha competências suficientes para ocupar esse cargo, mas, sinceramente, não esperava ocupar esse lugar. Pelo menos não tão cedo. Ocupar o lugar de maestro na banda onde tudo se inicia musicalmente, é especial para qualquer um.

 

Rui Lima durante o seu primeiro concerto à frente da Associação Filarmónica de Tarouca

 

Que balanço faz sobre o seu período enquanto maestro da Associação Filarmónica de Tarouca?

RL Em quase 4 anos o balanço é francamente positivo. Foram anos de muita aprendizagem. Tive a oportunidade de partilhar tudo o que aprendi e tive o privilégio de aprender muitas coisas para além da música. Fez-me crescer muito como músico e como ser humano. Sinto que as pessoas com quem trabalho me ouvem e se permitem a aprender e a ensinar, crescendo, desta forma, juntos. Espero que assim continue.

 

Que projetos tem em vista para realizar com a Associação Filarmónica de Tarouca e no concelho?                      

RL Um dos projetos que planeei ainda está em curso. A missa brevis de Jacob de Haan está a ser um sucesso. Conta com 3 concertos nos mosteiros e igrejas do concelho e culminará na Serra de Santa Helena com o último concerto deste projeto. Para este projeto e a convite da Associação Filarmónica de Tarouca foi integrado um coro com a participação dos Tarouquenses em geral. Para além de todas as festividades e encontro de bandas, em outubro está agendada a gravação do primeiro CD da banda. Será, sem dúvida, um marco importante na história desta banda e dos músicos.

 

Sendo professor na Academia de Música de Tarouca, no seu ponto de vista, o futuro musical do concelho está assegurado com os seus alunos?

RL Em parceria com o Município de Tarouca estou a tentar desenvolver e implementar uma plataforma, sólida, de ensino, gratuito, para os elementos das bandas filarmónicas. É um caminho longo a percorrer, mas estou convicto que em poucos anos poderemos colher alguns frutos e assim assegurar o futuro das filarmónicas no concelho.

 

Esperava algum dia atingir este patamar enquanto músico?

Desde o dia em que decidi ser músico profissional mentalizei-me de que seria um caminho longo e difícil. Sempre foi minha intenção ausentar-me da terra, durante um período indeterminado de tempo, e regressar com mais competências e conhecimento adquirido. Por todas as horas de estudo, por todo o tempo dedicado à música, por tudo o que passei, posso dizer que sim, esperava chegar onde estou. A meta, essa será sempre inalcançável.

 

Texto: Hildebrando Sarmento

 

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