Por detrás das máscaras de Carnaval

O Carnaval da Mealhada é um evento anual que decorre em fevereiro. Os desfiles na Mealhada atraem todos os anos milhares de visitantes à cidade. A preparação para os mesmos ocorre muito antes: “O Carnaval é só naquela altura, mas a escola trabalha todo o ano.”

Por Diana Duarte

Já se passaram mais de 50 anos desde os primeiros festejos de Carnaval na Mealhada. Desde então que tem vindo a ligar pessoas com a mesma paixão. Como é o caso de Rita Fernandes, uma nutricionista de 32 anos, que entrou numa escola de samba com 7 anos, e de João Almeida, um designer de 37 anos, que descobriu a sua paixão pelo Carnaval também com a mesma idade. Ambos pertencem ao G.R.E.S Batuque, uma escola de samba da cidade.

“Para dizer a verdade nós trabalhamos o ano todo para o Carnaval”

De acordo com os foliões, até ao desfile de Carnaval há preparação das fantasias, angariação de elementos, concursos de destaques de passistas e rainha de bateria, entre outros eventos. Rita Fernandes diz que as escolas começam as preparações para os desfiles três meses antes dos desfiles: “Assim a sério é em novembro que se começa a trabalhar”.

Rita Fernandes afirma que a Câmara da Mealhada oferece um subsídio às quatro escolas de samba do município: o Batuque, os Sócios da Mangueira, os Amigos da Tijuca e a Real Imperatriz. A mesma paga um valor estipulado por cada elemento das escolas. “Mas dificilmente a escola só gasta essa quantia [nos desfiles]”, reitera. “O Batuque necessita de ganhar dinheiro por ela própria para investir mais”, acrescenta a nutricionista.

“Ou seja, nas fantasias, no enredo, etc começamos três meses antes. Mas trabalhos, eventos e atuações para angariar dinheiro começam muito tempo antes.” – Rita Fernandes

Ver para além do produto final

De acordo com Rita Fernandes, o Carnaval começa numa assembleia onde se escolhe, por meio de concurso, o enredo, que, por outras palavras, é o tema do desfile da escola. O enredo é desenvolvido pelo designado carnavalesco ou equipa de carnavalescos: “[o carnavalesco é] quem idealizou a história que a escola vai representar na avenida”. Define-se também o samba-enredo, a música característica do tema da escola. Depois de idealizado, distribui-se ainda os papéis pelos foliões. Começa-se então os ensaios e a pensar nas coreografias.

Tendo em conta que a ordem pode diferir consoante os planos do carnavalesco, a ordem tradicional passa primeiramente pela comissão de frente, a ala que apresenta o enredo que a escola vai apresentar na avenida.

“O ideal é que o público olhe [para a comissão de frente] e perceba qual é a história da escola” – Rita Fernandes

De seguida, vem o mestre sala e a porta-bandeira, o casal que leva a bandeira da escola e que apresenta as cores e o pavilhão da escola. Depois vem a ala dos mirins, a das crianças. Sucede-se as alas das passistas e, posteriormente, a rainha de bateria e a própria bateria. Logo depois estão as baianas, uma ala em que as senhoras utilizam vestidos até aos pés e rodopiam durante o percurso do desfile. O Batuque tem uma particularidade diferente das outras escolas de dança: tem a chamada velha-guarda, uma ala onde a folia está presente nos foliões. Por último vem o carro da escola de samba, o que chamam de alegoria. Segundo Rita Fernandes, “todas estas alas vão a representar alguma coisa, então o ideal é que o enredo seja contado de uma forma coerente e harmoniosa ao longo do desfile”.

Divertimentos à parte, é hora de avaliar

O concurso de escolas de samba da Mealhada nasceu em 2005, com um artigo de opinião escrito sobre os desfiles para o Jornal da Mealhada. Foi com o apoio das escolas de samba, que, em 2006, surgiu a primeira edição do concurso. 

O concurso regula-se por um regulamento, o chamado regulamento do concurso do Carnaval da Mealhada. De acordo com Rita Fernandes, neste regulamento existe “9 quesitos: a comissão de frente, o casal mestre sala e porta-bandeira, bateria, harmonia, evolução, fantasias, alegorias, samba-enredo e enredo”. Todas as escolas começam com 10 pontos e vai se subtraindo décimas por cada erro cometido. A escola de samba vencedora é aquela que obtém o valor mais elevado.

João Almeida denota que “cada Carnaval tem o seu próprio regulamento”. Acrescenta ainda que “o Carnaval da Mealhada é idêntico ao Carnaval no Brasil, quanto ao regulamento”.

Mais do que uma escola, é um local de união

João Almeida e Rita Fernandes cruzaram caminho quando João Almeida mudou para a escola de Rita Fernandes: o Batuque.

Rita Fernandes tinha tendência para a dança em tenra idade. Quando uma pessoa que pertencia ao Batuque notou a sua paixão, acabou por levá-la para o mesmo.

“Carnaval é paixão!” – Rita Fernandes

Começou nos mirins, uma ala própria para as crianças. Um bocado mais velha passou para passista. Depois das passistas foi para a comissão de frente. De seguida concorreu a destaque de passistas, cargo que deteve por dois anos. Logo depois, tornou-se porta-bandeira, cargo que tem até hoje.

“O que eu mais gosto é ser porta-bandeira. É o que eu me identifico mais também.” – Rita Fernandes


Rita Fernandes, a porta-bandeira do Batuque

Em 1992, João Almeida, na altura com 7 anos, formou um grupo de bateria com os seus colegas do Hóquei. De acordo com o mesmo, as bacias e as caixas de biscoitos que muitas vezes são enganadoras e portam ferramentas de costura eram os seus instrumentos musicais e utensílios de cozinha eram as suas baquetas.

“Carnaval é arte!” – João Almeida


 João Almeida, integrante da Bateria do Batuque

O chamado “Felgueiras”, o já falecido comandante dos bombeiros e presidente da Associação de Carnaval da altura, viu-os e convidou-os para entrarem nos Sócios da Mangueira, uma outra escola de samba da Mealhada. João Almeida esteve nos Sócios da Mangueira de 1994 a 2000. Saiu dos Sócios da Mangueira para o Batuque depois disso. Só em 2002 é que começou outra vez a desfilar. Diferente da Rita Fernandes, o João Almeida esteve sempre na mesma ala: na Bateria. Comandou a Bateria e tocou todos os tipos de instrumentos da Bateria até hoje.

“À medida que vamos crescendo e a vida vai ganhando responsabilidades e obrigações. [É no Carnaval] que libertamos um pouco as nossas preocupações. É lá que vamos espairecer a cabeça dos problemas da vida.” – Rita Fernandes

Rita Fernandes afirma ainda que foi o Carnaval que que lhes permitiu crescer “pessoalmente, profissionalmente e socialmente”. Continua dizendo que conseguiram “crescer ao mesmo tempo que o Carnaval porque como é uma associação que lida com várias pessoas de diversas faixas etárias nós também aprendemos a crescer socialmente lá dentro: conseguimos aprender a trabalhar em equipa e a ser empáticos.”

O Batuque acompanhou-os nas várias fases da sua vida: na amizade, no namoro, no casamento e agora na paternidade.

“Já passámos por várias fases da nossa vida e o Carnaval esteve sempre presente.” – Rita Fernandes

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