Carnaval de Ovar: “O meu coração não bate, ele samba”

A edição de 2023 do Carnaval de Ovar tem início a 28 de janeiro e prolonga-se até ao dia 21 de fevereiro.  Após dois anos sem Carnaval, Ovar vai voltar a festejar a “Vitamina da Alegria”.

Reportagem de Inês Reis

Na Região Centro de Portugal, mais propriamente na cidade de Ovar, vive-se um dos maiores festejos de Carnaval do país. Este Carnaval tem 70 anos de história e ao longo destes anos o frio não demoveu os foliões nesta época carnavalesca.

Durante dois anos não houve desfiles carnavalescos em Ovar, devido à pandemia. Em 2022, o desfile não saiu à rua, no entanto os grupos tinham tudo preparado para o grande corso carnavalesco. “Os ensaios estão a decorrer desde o ano passado”, disse Luana Reis, membro da Escola de Samba Costa de Prata. “Tanto a coreografia, como os fatos foram feitos no ano passado”, acrescentou a passista. Tudo o que foi feito há um ano, vai ser apresentado na edição deste ano.

Normalmente, a preparação do Carnaval é feita com quase um ano de antecedência. “Mal acaba um Carnaval começamos logo a pensar no próximo”, explicou Luana Reis. Após cada edição é efetuada uma avaliação dos aspetos a mudar ou melhorar. “Segue-se a planificação para no início de setembro, prepararmos os procedimentos de aquisição de bens e serviços, ao nível logístico de programação e de segurança e vigilância”, disse Salvador Malheiro, Presidente da Câmara de Ovar.

Todos os grupos apresentam a sua maquete em Maio à Câmara Municipal de Ovar. No caso das Escolas de Samba, os inícios das preparações acontecem a partir de Setembro, altura em que são eleitos os destaques de chão, os destaques de carro, a madrinha de bateria e o samba enredo. Os Grupos de Passerelle e os Grupos Carnavalescos começam em reuniões a partir de outubro, para apresentar as maquetes ao público. Relativamente aos carros alegóricos são produzidos durante cerca de 2 meses pelos membros de cada grupo. “Os fatos são mandados à costureira, no entanto, no caso dos grupos de Passerelle e Samba, há detalhes que são cosidos pelos próprios elementos”, explicou Gisela Pinho, ex-membro de vários grupos carnavalescos, atualmente isenta.

Lara Gomes e Luana Reis

Neste momento, os Grupos Carnavalescos já organizam há cerca de um mês o Carnaval de 2023. “Já andamos com ensaios e provas de fatos, o que nos faz sentir cada vez mais próximas do grande dia de desfile, disse Gabriela Rivas, membro do grupo de Passerelle Melindrosas. “Estamos a entrar na reta final”, comentou Gabriela Gomes, coreografa da escola da Samba Costa de Prata.

“Como somos a maior Escola de Ovar, a logística também é enorme, e trabalhamos em equipa”, disse Gabriela Gomes, diretora de passistas na Escola de Samba Costa de Prata. “O desfile é o último passo. O antes é que torna esta arte mágica. Os ensaios e as noites mal dirimidas compensam e a sede torna-se a nossa primeira casa no período de Carnaval”, acrescentou Gabriela Gomes.

Um Carnaval sem competição

“Este ano vai ser um Carnaval diferente. Sem votações, não vai haver o sentimento de competição”, afirmou a passista Luana Reis. As votações para os grupos carnavalescos foram descartadas da edição 2023, de forma a contornar a pandemia. “A Câmara Municipal de Ovar adotará as medidas que forem impostas e/ou recomendadas pela Direção Geral de Saúde”, justificou Malheiro.

Na edição de 2023 vai haver melhoria nas condições de acesso e segurança ao público. “Vamos melhorar questões de proteção de pessoas e bens e haverá mais bilheterias na Grande Noite Mágica para evitar congestionamentos”, salientou o Presidente da Câmara de Ovar.

O Carnaval de Ovar atrai pessoas de todas as partes do país e a adesão do público tem vindo a aumentar ao longo do tempo. “Depois de dois anos de interregno, a expetativa é muito elevada para este ano. Estima-se a envolvência global de 300 mil pessoas”, disse Salvador Malheiro. Ovar delineou uma “programação elétrica e apelativa, capaz de mobilizar e atrair diversificados públicos, acrescentou Malheiro.

“O verdadeiro espírito carnavalesco”

“O Carnaval de Ovar consegue mostrar aos foliões o verdadeiro espírito carnavalesco”, comentou Gisela Pinho, de 20 anos, que recordou e partilhou o seu percurso carnavalesco. Passou por três grupos distintos: Grupo Carnavalesco Pierrots, Escola de Samba Charanguinha e Grupo de Passerelle Levados do Diabo. Desfilou pela primeira vez em 2007 nos Pierrots, um Grupo Carnavalesco associado a homens: “em momento algum me senti excluída. Nos dias de hoje, já há inúmeros grupos carnavalescos que incluem mulheres, e aliás há um representado pela figura feminina, de nome Carrucas”, frisou Gisela Pinho. “No dia do desfile, olhar ao redor e ver que todas as maquetes foram conseguidas e alegria que as pessoas transmitem é contagiante”, acrescentou.

Gisela Pinho

“Escolhi um Grupo de Passerelle, porque uma das minhas paixões sempre foi a dança. Desde os meus primeiros anos de idade comecei a dançar ballet e nunca parei de experimentar outros tipos de dança até hoje”, partilhou Gabriela Rivas, membro do Grupo de Passerelle Melindrosas. “Desde pequena que a magia do Carnaval sempre esteve presente na minha vida, e tendo amigas na Costa de Prata deu-me mais vontade de fazer parte do Carnaval de Ovar”, disse Luana Reis, membro da Escola de Samba Costa de Prata. “A primeira vez que desfilei foi uma memória inesquecível é um sentimento de outro mundo”, acrescentou a passista.

Gabriela Gomes, mais conhecida por Fricky é passista na Costa de Prata há 33 anos. Os primeiros passos de samba foram ensinados pelo seu pai que tem origens africanas. “Não fui eu que escolhi o samba, foi o samba que me escolheu a mim. Este amor está no sangue, não se explica, sente-se”, comentou Fricky.

“O Carnaval faz parte da minha vida desde pequenina, por influência da minha mãe”, disse Lara Gomes, passista na Escola de Samba Costa de Prata. “Quando fiz a minha primeira atuação em palco ao lado da minha mãe, foi uma sensação incrível”. É assim que descreve a sua melhor recordação do Carnaval, porque além dos desfiles existem atividades e espetáculos ao longo de todo o ano em Ovar alusivos ao Carnaval.

“O samba é uma arte que me leva a encontrar a minha essência

Gabriela Gomes, é passista desde os cinco anos de idade na Costa de Prata. Atualmente, tem 37 anos e além de passista é coreógrafa e diretora de passistas na Escola de Samba Costa de Prata. “O samba é uma arte que me leva a encontrar a minha essência, é um refúgio”, explicou Fricky.

Gabriela Gomes

“Já perdi a conta aos workshops que fiz até hoje. Através desta conexão, fui desfilar ao Rio de Janeiro em 2022 pela Escola de Samba Académicos do Salgueiro, que apadrinha a Costa de Prata”, partilhou Gabriela Gomes.

“Este ano a maquete é mais simples do que estamos acostumados porque será um ano sem votações, ou seja, é mais para aproveitar o momento e divertirmo-nos”, explicou Lara Gomes, filha de Gabriela Gomes e passista na Costa de Prata. O tema da Costa de Prata é “O vermelho que nos move” e está relacionado com a história da escola ao longo dos anos. Uma homenagem à primeira Escola de samba a surgir na cidade de Ovar. “Cada ala tem um fato representativo de um ano ou acontecimento marcante para a história da nossa escola”, disse a passista Lara Gomes.

Na Costa de Prata “existe uma ideologia e valores que são transmitidos de geração em geração”, disse Gabriela Gomes. “É necessário ter o compromisso, a entrega, o empenho, a dedicação e união de grupo”, salientou a passista. Gabriela Gomes tem um contributo fundamental nesta escola. “O samba é uma firma de vida e eu amo a minha vida com o samba dentro”, explicou. “Eu ensino a sambar, crio coreografias, procuro patrocínios, ajudo a fazer os fatos, enfim tudo o que precisam de mim eu faço, sem pedir nada em troca”, acrescentou a passista.

“O meu coração não bate, ele samba”, é a deixa de Fricky, que vive para o samba intensamente. Em Ovar o Carnaval está de regresso e traz consigo a folia, a diversão e a “Vitamina da Alegria” que é o famoso lema ovarense.

Vitamina da Alegria

O Carnaval de ovar, também conhecido como a “Vitamina da Alegria”, é a tradição mais importante para o povo vareiro. “O Carnaval de Ovar é a festa do nosso Município e é um dos maiores fatores de atração turística e de dinamização da economia local”, explicou Salvador Malheiro. “Durante a época carnavalesca os hotéis ficam com lotação esgotada e os restaurantes, cafés e outro comércio local elevam exponencialmente a sua receita”, acrescentou.

A “Vitamina da Alegria” é financiada pala Câmara Municipal de Ovar, que embora não cubra a totalidade dos custos, ajuda a minimizar as despesas dos grupos carnavalescos. Estes gerem ainda receitas próprias, através das cotas que cada membro paga ao grupo anualmente.

O Carnaval de Ovar adotou a maioria das caraterísticas vivenciadas no passado, mas reinventou-se com o passar do tempo. Esta festividade continua a ser celebrada pelas ruas da cidade, com a saída dos carros alegóricos e com pessoas fantasiadas. Desta tradição, nasceu a Aldeia do Carnaval que abrange a sede dos atuais vinte e quatro grupos, dos quais 4 são Escolas de Samba, 6 são Grupos de Passerelle e 14 Grupos Carnavalescos, que desfilam e animam as ruas de Ovar. Neste lugar é realizado festas, convívios e ensaios e cada sede possui características que a distingue das demais.

Em Ovar, o Carnaval vai além de dois desfiles carnavalescos. “Decorre durante quase quatro semanas com dezenas de eventos alusivos ao Carnaval”, disse Malheiro.

A semana dos desfiles é a mais importante. A iniciação dessa semana é a noite de Quim Barreiros, que coincide sempre a uma quinta-feira. A partir desse dia há farra todos os dias. O Grande Corço Carnavalesco decorre ao domingo e terça-feira durante o dia, mas as Escolas de Samba têm o desfile noturno, além dos diurnos.  A Noite Mágica, é a noite emblemática do Carnaval de Ovar e realiza-se sempre a uma segunda-feira. Durante a épica festiva, é instalado o Espaço Folião, uma tenda, localizada no estacionamento Senhora da Graça em Ovar, onde há várias atuações de artistas convidados pela Câmara Municipal da cidade.

Já se encontra disponível a venda de bilhetes online para os desfiles na plataforma BOL. Foi o primeiro ano de venda online dos bilhetes e a procura tem sido muito positiva, explicou Malheiro. “Já temos quase 70% de bilhetes vendidos de domingo, 40% de sábado e 30% de terça-feira e não temos dúvida que sábado e domingo esgotarão”, adiantou o presidente da Câmara de Ovar, sendo de ressalvar que os bilhetes de peão só são colocados à venda no próprio dia.

a