“Estudar e treinar fizeram-me abdicar de muitas coisas”

André Coelho tem 24 anos, é jogador da equipa de futsal do Sport Lisboa e Benfica e recentemente sagrou-se campeão europeu ao serviço da Seleção Portuguesa. Começou por jogar no ABC de Nelas, mas o talento que demonstrava levou a que fosse reconhecido e rumasse à 1ª Divisão Nacional de futsal. André passou também pela equipa universitária do Instituto Politécnico de Viseu e pela equipa da Associação Académica da Universidade do Minho. Enquanto jogava manteve sempre um excelente desempenho a nível académico e, hoje, André tem mestrado em Engenharia Civil.

 

Quando era jovem e perdeu a sua mãe, como foi lidar com essa situação e conseguir manter um excelente desempenho, tanto a nível escolar, como enquanto jogador?

André Coelho Não foi uma situação fácil. Foi um choque muito grande em que tive de quase “começar” uma vida nova. Mas o sonho dela sempre foi que concluísse o curso e tivesse sucesso a nível profissional e é nisso que penso todos os dias e me motiva.

 

Quando era mais novo teve de optar entre o futsal e o andebol. Quais foram os fatores que mais pesaram na sua escolha?

AC Foi a paixão que tinha pelo futsal e claro era melhor neste desporto. Mas o andebol também é um desporto que gosto muito e que continuo a acompanhar.

 

Ainda jogador do ABC Nelas, imaginava estar no patamar em que está hoje?

AC Não, de facto nunca pensei atingir um patamar tão alto. Mas com muito trabalho, dedicação e sacrifício tudo se consegue.

 

Qual foi o impacto que o ABC Nelas teve na sua formação enquanto jogador e enquanto pessoa?

AC O ABC Nelas será sempre o meu clube de coração pelo que me deu. Desde que me lembro que existo que comecei a jogar futsal naquele clube, só sai quando tinha 19 anos. Foram anos de aprendizagem não só de futsal, mas também como homem, auxiliado por pessoas fantásticas e amigas que agradeço muito me terem ajudado e me permitirem chegar ao patamar onde estou.

 

André Coelho nas camadas jovens do ABC Nelas

 

O primeiro desafio após o ABC foi representar a seleção distrital de futsal de Viseu. Como classifica esse momento? 

AC Foi mais uma vitória a nível profissional ter sido convocado para a seleção e poder disputar um campeonato interassociações.

 

Após o bom desempenho ao serviço da seleção distrital foi a vez de dar um passo maior, a chamada à seleção nacional de sub-20.Como viveu este momento?

AC Foi um sonho tornado realidade. O sonho de qualquer jogador é ser chamado à seleção e eu não fujo à regra. Foi uma grande alegria e um enorme orgulho.

 

Como classifica a sua passagem pela equipa de futsal universitário no Politécnico de Viseu e também pelo politécnico em si?

 AC Foi uma ótima experiência poder jogar um campeonato nacional universitário pela minha universidade com os meus colegas. A universidade em si também gostei.

 

Os estudos proporcionaram-lhe a experiência de jogar tanto na equipa universitária de Viseu como na de Braga. Qual foi a importância que estes dois momentos tiveram na sua carreira enquanto jogador?

AC Foram importante claro. Era uma competição diferente, também muito competitiva onde tive a felicidade inclusive de ser bicampeão nacional e ser chamado à seleção nacional universitária para disputar um mundial.

 

A primeira vez que André Coelho enfrentou o IPV, foi homenageado pela instituição viseense

 

Que memórias guarda do Mundial Universitário que disputou em Espanha

AC O mundial foi em Antequera. Guardo memórias fantásticas, foi a minha primeira grande competição pelo nosso país e foi um grande orgulho e um grande desafio.

 

Estreou-se com apenas 19 anos na 1.ª divisão nacional de futsal ao serviço do Braga e, logo na primeira época, foi eleito o jogador revelação da Liga Sportzone. Este prémio foi importante para o motivar a ser melhor?

AC Claro que qualquer prémio individual nos enche de orgulho e nos motiva a continuar a trabalhar ainda mais. Foi um grande orgulho e uma grande motivação para continuar e conseguir atingir outros patamares.

 

Visto que já concluiu o mestrado enquanto jogava no Braga, como foi conciliar os estudos e a sua profissão enquanto jogador?

AC Foi muito difícil. Estudar o dia todo e a noite ir treinar e passar os fins-de-semana fora fez com que tivesse uma vida cheia onde tivesse de abdicar de muitas coisas para fazer as duas coisas. Havia vezes que aproveitava as viagens no autocarro para os jogos a estudar, outras vezes onde ia direto dos exames para os jogos. Não foi fácil, mas como disse numa pergunta anterior com dedicação tudo se consegue.

 

Como foi para si ser chamado para representar a seleção nacional no Mundial da Colômbia ao lado de nomes como Ricardinho?

AC Foi um momento incrível e único na minha vida. Foi a primeira vez que fui chamado para a seleção A e logo para um mundial. Poder encontrar jogadores com o Ricardinho foi a cereja no topo do bolo. Eram jogadores que são os meus ídolos e que apenas via na televisão e poder estar a jogar ao lado deles era um uma sensação incrível e que me enche de orgulho.

 

Sabendo que foi um jogador decisivo ao longo de todo o campeonato da Europa, e ainda mais decisivo na semifinal ao apontar dois golos que carimbaram a passagem à final, esta conquista teve um sabor ainda mais especial? 

AC Não. Para mim marcar ou não marcar é me completamente indiferente.

 

Qual era o ambiente vivido entre toda a seleção durante o Europeu na Eslovénia?

AC Era fantástico, foi um ponto fundamental para termos conseguido ganhar o título. Éramos uma família e quando todos estamos a rumar para o mesmo lado tudo se torna mais fácil.

 

Qual o segredo ou o “ingrediente” chave para terem conseguido alcançar tal feito histórico?

AC O segredo esteve na perfeita preparação quer em termos físicos quer psicológicos por parte de todo o staff e o principal que foi a união que tivemos, a família que criamos naquele curto espaço de tempo.

 

Equipa com o Presidente da República após a conquista do Europeu de Futsal 2018

 

Acha que a união e companheirismo entre todos foi o segredo chave para a conquista do troféu mais importante na história do futsal português?

AC Foi como disse na questão anterior foi um dos pontos fundamentais, sem ela não tinha sido possível.

 

Qual a sensação de conquistar o Campeonato da Europa de Futsal, troféu conquistado pela primeira vez pela Seleção Nacional?

AC É uma sensação indiscritível. Ganhar é sempre bom, mas ganhar pelo nosso país um título tão importante como este não existem palavras que possam descrever o momento. É um sentimento de enorme felicidade onde vemos todo o nosso esforço e dedicação serem recompensados.

 

Como viu a homenagem feita pelo Município de Nelas, que contou com uma adesão em massa, pela sua mais recente conquista?

AC Foi um momento emocionante, de grande orgulho. Ver todas aquelas pessoas da minha terra deslocarem-se ao pavilhão para me congratular, não tem descrição. Foi uma sensação única que espero repetir.

 

O seu pai, e também seu treinador no ABC de Nelas, foi o maior “apoio” em toda esta caminhada enquanto jogador e também como pessoa?

AC Obviamente que foi o maior impulsionador para ser jogador de futsal. Ele sempre foi o meu treinador em todos os escalões de formação, foi ele quem me incutiu esta paixão e claro que hoje em dia continua a ser o meu maior apoio e poder deixá-lo orgulhoso com as minhas conquistas é a minha maior felicidade.

 

Qual é o sentimento gerado em si ao ser reconhecido pelas pessoas no teu dia-a-dia, como por exemplo quando sai à rua?

AC É um sentimento de grande felicidade saber que sou reconhecido pelo meu trabalho. É um sinal que estou a fazer as coisas bem e que devo continuar.

 

Como foi pela primeira vez partilhar balneário com os grandes nomes do futsal português? Como foi a receção da parte deles?

AC É uma sensação ótima. São pessoas que estamos habituados a ver na televisão e idolatrar e poder partilhar o balneário com eles é fantástico. Sempre fui muito bem recebido fizeram-me sentir integrado e sempre me ajudam em tudo.

 

Após este progresso notável que teve até hoje, quais são os seus objetivos para o futuro?

AC Os meus objetivos são continuar a jogar ao mais alto nível quer no Benfica quer na seleção e continuar a ganhar muitos títulos.

 

Como vê o futuro do futsal em Portugal?

AC Vejo um futuro risonho com cada vez mais praticantes é maior aposta nesta modalidade. Este título trouxe uma grande alegria ao nosso país, que fez com que o futsal fosse visto de outra maneira. Penso que veio impulsionar ainda mais a aposta realizada no futsal.

 

O que significa ter sido escolhido para ser embaixador do desporto em Viseu?

AC Significou muito. Alcançar esse prémio é o reconhecimento de que todo o trabalho que faço foi bem feito. É uma distinção que em muito me orgulha também pelo facto de ser pela cidade onde nasci.

 

Por norma costuma acompanhar o jornalismo desportivo nacional? Qual é a sua opinião em relação à importância dada ao futsal no mesmo?

AC Sim costumo. Penso que não é dado o devido valor a nossa modalidade. Eu percebo que o futebol tem um papel determinante no nosso jornalismo mas penso que o futsal deveria ser mais valorizado. Gostei de ver em muitas capas dos jornais a conquista do nosso campeonato europeu e deveria ser sempre assim o destaque à nossa modalidade.

 

André Coelho e Nilson momentos após a conquista do Europeu de Futsal 

 

Todos os bons jogadores de futebol dariam um bom jogador de futsal? E o contrário?

AC É uma questão difícil de responder. Cada jogador tem o seu estilo de jogar que se pode adaptar mais ao estilo de futebol ou de futsal. Pessoalmente acho exatamente o oposto da pergunta, ou seja, é mais fácil um jogador sair do futsal para o futebol do que o contrário.

 

O que é que o jogador de futsal tem de ter a mais em relação a um jogador de futebol de 11?

AC No futsal temos de executar e pensar muito rápido. Temos pouco espaço as decisões são realizadas num curto período de tempo e espaço, e penso que é essa rapidez de pensamento que um jogador de futsal deve ter.

 

Acha que se joga bom futsal em Portugal?

AC Sim. Temos grandes jogadores e treinadores de alto nível. A prova foi o título europeu que conquistamos. Foi uma vitória do jogador português, do treinador português e de todo o futsal em Portugal. Acho que já chega de dar sempre valor aos outros e começarmos mais a valorizar o que é nosso.

 

Quem é o seu ídolo?

AC Sempre foi e sempre será o meu pai. Foi ele que me incutiu a paixão pela modalidade e me acompanha sempre.

 

Como é a sua vida em Lisboa?

AC É uma vida normal de jogador profissional. Praticamente durante o dia tenho treino e aos fins-de-semana temos o jogo.

 

Ser ambidestro é uma vantagem no futsal?

AC Sim claro que é uma vantagem. Conheço poucos jogadores que tenham essa capacidade e têm algumas vantagens em relação aos jogadores que jogam melhor apenas com um pé.

 

Que conselhos pode dar aos mais novos?

AC O principal conselho é que nunca desistam dos vossos sonhos tal como eu fiz. Tracei objetivos na minha vida e fiz sempre de tudo até alcançá-los. É importante também nunca nos acomodarmos e nunca estaremos satisfeitos, é assim que eu olho para a vida. Ter sempre objetivos e lutar por eles.

 

Texto: Rafael Santos

Imagens: DR

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