O mundo de Sara é o nosso mundo

Com um nome próprio fica resolvido o nome da série em que a personagem principal, que o detém, é o epicentro da narrativa. Sara aparece na ficção portuguesa como uma lufada de ar fresco, longe de novelas e entretenimento duvidoso em horário nobre.

A ideia original é de Bruno Nogueira que, juntamente com Marco Martins (realizador) e Ricardo Adolfo, constroem e desconstroem o mundo de uma personagem. Sara, encarnado por Beatriz Batarda, é uma actriz reconhecida no seu meio. Envolvida no papel principal de um filme que não se revê, encontra uma barreira que, apesar do esforço penoso e contínuo, não consegue ultrapassar. Sara não chora. “Tens é de chorar”, suplica o realizador da longa metragem. Por baixo de cenas repetidas e chuva artificial, com frio, Sara não solta uma lágrima. Procura a dor dentro de si para tentar representar a dor da personagem. Acaba por chegar ao limite e retira-se das filmagens para não mais voltar.

A personagem principal vai-se desvendando aos poucos através das personagens do seu núcleo. O elenco de luxo conta com Albano Jerónimo, José Raposo, Rita Blanco, Miguel Guilherme, Nuno Lopes, entre outros. Entre planos bem construídos e tons escuros, a acção decorre em tom trágico, melancólico e, simultaneamente, pisando terrenos de sátira e comédia. Um pouco à semelhança de projectos anteriores na televisão, Bruno Nogueira parece deixar uma marca em que metáforas e referências surgem sem avisar. O mundo da televisão e cinema, normalmente associado a grandes privilégios é despido de mordomias e apresentado como algo mais autêntico, precário e difícil.

Assim como o pai de Sara luta contra o corpo por ser velho, Sara luta contra o corpo para ser melhor actriz. Luta contra o corpo para não ceder às pressões do dia-a-dia dentro e fora da representação. Sara é uma série sobre a fragilidade, coragem, tristeza, felicidade. É sobre a condição humana.

 

Texto: André Antunes

a