“Há outras formas de amor que se pode dar a uma criança”

Olga Sousa desde criança que sonha em ser mãe. Sem parceiro, embarcou na viagem da inseminação artificial em Espanha. Atualmente, com 45 anos e sem sucesso a engravidar por via da inseminação, avançou para o processo de adoção.

Como surgiu a ideia de realizar uma inseminação artificial?

Olga Sousa Surgiu pela grande vontade que tenho de ser mãe e pelo facto de não ter companheiro.

 

Já tinha conhecimento de alguém que tivesse realizado esse processo?

OS Sim, uma grande amiga minha teve um filho por via da inseminação artificial.

 

E a sua amiga deu-lhe alguma dica para a inseminação?

OS Sim, ela recomendou-me a médica onde tinha ido para tratar do processo. Na altura, em que fiz a inseminação ainda não era permitido fazer cá em Portugal, por isso tive de ir fazer a Espanha. Essa médica, como tinha conhecimento da clínica de Espanha, as consultas e os exames foram realizados cá e, no meu período fértil, realizei a inseminação.

 

Que idade é que tinha quando começou com o processo?

OS Tinha 43 anos.

 

Da primeira consulta até à colocação do espermatozóide passou quanto tempo?

OS Eu comecei a fazer as consultas em setembro de 2015. Fiz o exame das trompas de Falópio em outubro e em novembro fiz a primeira inseminação.

 

Como decorreu o processo de inseminação?

OS Inicialmente tive de fazer vários exames para saber se ainda era viável, ou não, engravidar devido à minha idade. Fiz análises clínicas, exames às trompas de Falópio e ecografias. Na altura em que estava a fazer a ovulação, fiz uma ecografia para ver como é que estava a ovulação, e se estava a fazer muito folículo ou não, e mediante isso marquei com a clínica de Espanha para poder fazer a inseminação.

 

Que cuidados teve de ter antes e depois da inseminação?

OS No antes, não há que ter muitos cuidados. No após da inseminação é o que uma grávida tem de ter: nada de esforços, descansar e repousar, até se saber se o teste é positivo ou negativo.

 

Realizou quantas tentativas para tentar engravidar?

OS Quatro e engravidei na terceira.

 

Que sintomas teve de que estava grávida?

OS No processo da inseminação eu tomei progesterona e, por isso, tive sintomas que são idênticos aos de uma gravidez. E como já tinha tido alguns sintomas antes da progesterona nunca valorizei, embora, a minha cara estivesse diferente. Houve um dia, em que fui a uma festa da empresa onde trabalho e já estava grávida, mas não sabia, e um amigo meu disse que eu já estava grávida e eu não acreditei. Até que na segunda-feira seguinte fiz as análises onde confirmei que estava mesmo grávida. Era engraçado, porque as pessoas de fora notavam mais em mim que já estava grávida do que eu. Só notei que me cresceram as mamas e que as minhas roupas estavam apertadas. Nas outras inseminações, as mamas incharam, mas nada igual como quando engravidei.

 

Por que não conseguiu avançar com a gravidez?

OS Abortei espontaneamente às sete semanas.

 

Como percebeu que tinha sofrido um aborto espontâneo?

OS Tive um corrimento de sangue durante dois dias. No domingo fui ao hospital, fizeram uma ecografia e disseram-me que estava tudo bem. Vim para casa e na segunda-feira continuei com o corrimento, mas como me disseram que aquilo podia ser normal deixei estar. Na terça-feira notei que tinha um corrimento maior e fui logo de manhã ao hospital e disseram de novo que estava tudo bem e à noite tive o aborto. Estava no quarto e comecei a sentir um corrimento maior. Como costumo dizer, ao menos se não era para ir para a frente, ainda bem que foi tão cedo. Porque uma pessoa já se apega tanto a uma coisa que quase não conhece, pois só vi um pontinho na ecografia, e ao mesmo tempo se aquilo avançasse muito mais, acho que o sentimento ainda ia ser pior. A mim ainda me custa falar disto, portanto iria ser muito pior. Apesar de ter perdido o bebé com sete semanas, eu ainda recebi presentes para a criança.

 

O que sentiu ao perceber que a gravidez não tinha evoluído?

OS Nas duas primeiras tentativas encarei bem o facto de não ter conseguido engravidar, porque é um processo que só se consegue ao final de algumas vezes e isso é normal, ainda por cima dada a minha idade ainda complicava mais. Após ter engravidado, foi complicado porque foi um processo de perder algo que tanto queria. Depois de ter sofrido o aborto, a inseminação que mais me custou não ter conseguido foi a de maio, pós-aborto. Essa custou-me mais.

 

Qual foi o tempo de intervalo entre as quatro tentativas?

OS Foi de apenas um mês. Nas duas primeiras inseminações eu fiz tratamento, portanto tomei hormonas para aumentar os folículos e para ter mais ovulações, para que a probabilidade de engravidar fosse maior. Quando fiz a segunda em dezembro de 2015, e que foi sem sucesso, a médica disse que íamos parar com o tratamento e que íamos dar um mês de pausa. E eu sugeri à médica realizar a inseminação nesse mês de pausa, foi aí que engravidei sem medicação. Depois do aborto, tentei outra vez em maio. Eu abortei em março e em maio voltei a tentar engravidar. Ia tentar novamente uma quinta vez, só que não pude fazer a inseminação porque a médica não conseguiu ver se a trompa direita estava em condições ou não, e eu só podia fazer a inseminação quando estivesse a ovular do óvulo esquerdo. Como estava a ovular do direito não deu para avançar com a inseminação. Aí percebi que era um sinal e que teria de avançar para a adoção.

 

Desde a primeira consulta até à inseminação passou quanto tempo?

OS Eu comecei a fazer as consultas em setembro de 2015. Fiz o exame das trompas de Falópio em outubro e em novembro fiz a primeira inseminação.

 

Quanto custou no total o processo?

OS A primeira inseminação é mais cara porque tem de se fazer mais exames. Cada inseminação custou 550 euros, sem contar com a viagem para Espanha e alojamento, ou seja, cada inseminação custou à volta de 750 euros.

 

Quanto tempo ficava em Espanha?

OS Era rápido. Fazia a inseminação, estava 15 minutos a repousar e depois podia vir embora.

 

O facto de ter o seu filho através de um dador anónimo de esperma era motivo de preocupação?

OS Não, se me preocupasse não o faria.

 

Recebeu apoio psicológico durante o processo de inseminação?

OS Não, porque era uma coisa que eu queria.

 

Explicaram-lhe porque não conseguia engravidar?

OS Não, há vários fatores que podem condicionar uma gravidez. Eu nunca tive de fazer os testes de coagulação. Há vários testes que há necessidade de fazer quando se tem vários abortos. Eu só tive um aborto e quando ia tentar mais uma vez pós-aborto não podia e então percebi que estava na altura de parar. Há outras formas de amor que se pode dar a uma criança através da adoção.

 

Foi difícil perceber que teria de desistir da ideia de engravidar e optar por ter o seu filho por via da adoção?

OS É difícil porque ainda se pensa em tentar mais vezes, e na possibilidade de ainda ser capaz. É sempre um e se. Fica sempre no ar, porque se consegui uma vez, podia conseguir mais vezes, mas dado o processo que é tão doloroso psicologicamente preferi parar.

Um ano e três meses

Como se processa o pedido de adoção?

OS Eu já estou no Banco de Adoção há um anos e três meses. É preciso ir à Segurança Social da nossa área de residência e depois ir a uma sessão de esclarecimento. Depois dessa sessão é que se podem colocar os papéis para adoção, porque nessa reunião, ou tu queres mesmo adotar ou as tua ideias vão-se embora. Porque eles pintam o pior cenário de adoção. Porque as crianças que lá estão são crianças que já perderam muita coisa, já passaram por vários traumas. Ou vais buscar ao hospital pequenino e mesmo assim pode ter sofrido traumas durante a gravidez devido aos processos que os pais passaram, alcoolismo, drogas, o que quer que seja. Mas na reunião pintam o pior cenário. E a partir daí tem de se preencher um inquérito, que se entrega na segurança social e a partir daí tem-se seis meses para colocar o processo inicial onde se passa por duas sessões. Uma com as técnicas da ação social e outra com uma psicóloga em que perguntam tudo sobre a nossa vida, a infância, como é a tua relação com os teus pais, quem são as pessoas que te podem apoiar se for necessário com a criança, a tua rede de apoio. Vêm ver as condições que tu tens, e no final, antes de passarem o certificado há uma reunião com vários pais que também querem adotar em que nos apresentam casos de crianças que estão para adotar. Eu já estou apta para ser mãe de adoção, já tenho o certificado, daqui a dois anos tenho de o renovar porque o certificado só tem três anos de validade e as adoções são muito atrasadas.

 

Já há alguma criança em vista para a Olga adotar?

OS Não. Agora estou à espera e quando o perfil de uma criança que esteja numa instituição seja adequado com o meu perfil, vou ter a sorte de ser a escolhida.

 

Tem de indicar algum perfil que prefere relativamente à criança que vai adotar?

OS Não, a única coisa que se indica é a faixa etária que preferimos, se quero menino ou menina, se pode ser de outra raça ou não, se pode ter determinado tipo de doenças, se pode ser filho de mãe que tenha HIV, hepatite C, ou mãe alcoólica. Portanto, todas as crianças que nascem de pais assim, o tratamento é feito logo à nascença e a criança acaba por não ter a doença. Normalmente, não são portadoras. Portanto, eu não me importo de ter uma criança dessas, porque não têm culpa de vir ao mundo. Para mim é indiferente ser mãe de um menino ou de uma menina, mas a faixa etária que escolhi foi até aos três anos. Na escolha da faixa etária tive mais cuidado, mas é a faixa etária que todas as pessoas optam, portanto é mais complicado. Um dos requisitos da adoção é que com o avançar da idade, não se pode ter uma diferença de 50 anos com a criança.

 

O facto de tentar adotar uma criança e ser mãe solteira está-lhe a dificultar o processo?

OS Não, acho que não porque isso também a haver com as condições e com a nossa forma de estar na vida. Portanto, tenho a certeza que há-de haver um casal que não deve ter tantas condições quanto eu para ter uma criança.

 

Que processo considera ser mais difícil: o da inseminação artificial ou o da adoção?

OS A inseminação é mais violenta psicologicamente, porque a adoção agora é a espera. Tu vives a tua vida, não pensas muito nisso porque se pensares começas a stressar e não vale a pena. É viver a vida um dia de cada vez e à espera de uma criança que venha ter às tuas mãos.

 

Texto: Carolina Dias

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