Tabua D’aço: o restaurante no “fim do mundo” que apoia o comércio local com o único green chefe português

Combater o desperdiço, apoiar a região e apresentar qualidade são algumas das regras do restaurante Tabua D’aço, no distrito de Viseu. Thomas Egger, chef e proprietário, é o único português a ter a distinção de “Green chef”. Feito que se deve ao facto de todos os dias se preocupar com “ambiente, reciclagem e não usar químicos nem nada agressivo”, e também apoiar o comércio local em Tabuaço, no “fim-do-mundo”, como gosta de lhe chamar.

Reportagem de Luciana Soares e Mariana Fernandes

O olhar sobre o Douro prendeu desde logo Thomas Egger a querer “abrir um restaurante” em Tabuaço. Tudo o que é confecionado provém de produtores tabuacenses, os “amigos” do Chef. O apoio de todos foi essencial e como assume Thomas Egger “o comprar coisas fora já não é uma questão”. “As pessoas de Tabuaço ajudam-me e eu ajudo-as”, completa o chef.

Fátima Egger, esposa e proprietária, iniciou esta “aventura” há mais de 20 anos e afirma que “é muito difícil gerir o restaurante, no entanto também é reconfortante”. “Aqui estamos em ambiente familiar, eu, o Thomas e os nossos filhos”, revela a proprietária. A continuidade do negócio depende da família e o grande objetivo é conseguir levar o nome de Tabuaço mais longe. “Ver figuras públicas virem aqui e darem-nos os parabéns, é um orgulho enorme”, admite Fátima Egger.

O Tabua D’aço é um restaurante que prima pela igualdade. Thomas Egger revela que no restaurante “pessoas de gravata estão ao lado de bombeiros”, acredita ainda, que o ambiente vivido é muito familiar e “que não há nenhum tipo de distinção. O chef acredita que a comida gourmet já não é tão procurada. “Hoje as pessoas optam pela comida de casa” e refere que está “farto da chamada cozinha de Fine Dining (estilo gourmet)”.

Thomas Egger

A vida dedicada ao negócio

Nem só da restauração sobrevive Thomas Egger, que apostou, em fevereiro de 2020, no Alojamento Local (AL) “Casa dos Ruis”, também em Tabuaço, mas o espaço encerrou em março do mesmo ano, devido à pandemia da Covid-19. No ano de 2020, segundo os dados divulgados pelo INE, foram menos 61% de turistas em Portugal, o que afetou diretamente os estabelecimentos turísticos. Segundo fontes oficiais de estatística, foram cerca de 50% os alojamentos encerrados ou sem hóspedes.

Melina Costa é a rececionista do AL “Casa dos Ruis”. Esta confessa que, mesmo não sendo formada na área, agarrou esta oportunidade de trabalho, porque “em Tabuaço não há muita opção nem oferta”. Mesmo com todas as regras e medidas de segurança, a rececionista não teve dificuldade em se adaptar a este método de trabalho, até porque, como revela, a sua “normalidade é trabalhar com Covid” e, por isso, “foi muito fácil a adaptação”. Apesar de tudo, quer no restaurante, quer no alojamento local a procura continua a ser elevada, mas “apesar disso ainda vai muita gente [ao alojamento local], mais portugueses do que estrangeiros” afirma Melina Costa.

Casa dos Ruis

Com uma vida dedicada ao negócio e sem medo de arriscar, Thomas Egger, em conversa com amigos numa das suas viagens, decidiu criar uma marca própria de azeite, a Portugal Elements. “Ninguém acreditava, mas eu acreditei, arrisquei e hoje vejo isto com um grande orgulho porque é tudo de Tabuaço”, sublinha o proprietário.

Como o próprio revela, passa muito tempo em viagens, principalmente para o seu país de origem, a Áustria, onde exporta os seus produtos. Hoje já vende para “restaurantes com estrelas Michelins”, tendo registado a marca Portugal Elements em toda a Europa, tornando-se uma das que regista maior exportação no concelho viseense.

O chef televisivo e os prémios de louvor

Reconhecido por todo o país, Thomas Egger participa em vários programas de televisão. Já esteve no “Alô Portugal” e recentemente recebeu o convite para cozinhar na “Casa Feliz”, o programa das manhãs da SIC. Esta é a maior publicidade do Restaurante, no entanto o grande problema é a falta de tempo. “Não tenho disponibilidade para ir para a televisão, mas sempre que me convidam eu vou”, admite o chef.

Chef esteve no programa Alô Portugal

A cozinha é o que verdadeiramente apaixona o Chef e, mesmo em tempo de pandemia, a grande surpresa surgiu quando recebeu o prémio Traveller’s Choice com base nas avaliações feitas no TripAdvisor, uma plataforma digital que fornece informações e opiniões de conteúdos relacionados ao turismo e restauração. Este é “um daqueles prémios, que só se ganha uma vez na vida e melhor ainda foi ganhar isto na fase da pandemia, é sinal de que o trabalho é reconhecido”, revela Thomas Egger.

Desde sempre ligado à restauração e hotelaria, o proprietário começou por trabalhar nos hotéis da família e, mais tarde, decidiu estudar restauração. Até então a ideia de cozinhar não era um sonho, mas tudo mudou quando veio para Portugal e percebeu que “ou se contrata alguém para confecionar os pratos ou se cozinha” e hoje o chef Thomas Egger revê-se como um chef livre que faz o que quer.

Inovar na pandemia e os clientes

Com todas as dificuldades que o setor da restauração atravessou, Thomas Egger acredita que nem tudo foi mau. Com a pandemia, “aprendemos a ser diferentes e a inovar”, refere. O Take away não era novidade, mas com o confinamento surgiu a ideia de realizar “sessões de cozinha online”. Sozinho, Thomas Egger criou “cestos com comida para os clientes e lá dentro ia a receita” de forma a criar um convívio online. “Cozinhava cada um na sua casa e comíamos todos juntos mesmo à distância”, afirma o proprietário.

Assumindo que há um prato de eleição, Thomas Egger acredita que o Bacalhau na Telha é o prato mais “icónico do Tabua D’aço. Criado em conjunto com os seus primos, esta é uma das refeições que atrai mais clientes. Na sua carreira profissional, não há “nenhum prato que tenha gostado mais ou menos de fazer, quando estou a cozinhar, estou sempre a pensar na minha mãe, tudo o que faço é a pensar nela”, afirma Thomas Egger.

Maria Soares, cliente “desde sempre” do restaurante Tabua D’aço, durante um ano “ia buscar todos os dias o almoço, através do take away”. Hoje com todos os efeitos nefastos da pandemia, a tabuacense de 56 anos assume que não voltou a frequentar o restaurante devido “ao medo e à insegurança”, mas garante que “conhecendo bem as instalações e os trabalhadores, não há perigo”.

Leonel Dias, fornecedor de batatas, azeitonas e outros produtos agrícolas do restaurante Tabua D’aço e também cliente, admite que da mesma forma que o restaurante o ajuda, também ele sempre que consegue opta “pelo Tabua D’aço”. Acrescenta ainda que, esse não é o único motivo que o faz visitar o estabelecimento; também “a qualidade dos alimentos e a simpatia dos que lá trabalham” são fatores que o leva a frequentar o restaurante.

Antes da pandemia da Covid-19, Leonel Dias “frequentava o restaurante pelo menos duas vezes por mês”. Como a situação se agravou e com o encerramento deste setor, o cliente tabuacense deixou de ir ao Tabua d’aço e preferiu ficar em casa “porque tinha receio de apanhar o vírus”, esclarece. Segundo Leonel Dias e Maria Soares, este estabelecimento “é um ponto de paragem para os tabuacenses e para quem vem de fora”.

Quase um ano fechados, os restaurantes só puderam reabrir as portas em abril de 2021 depois de um dos períodos mais negros da história da humanidade. Em fevereiro deste ano, segundo os resultados do inquérito realizado pela AHRESP, 51% das empresas estavam com a atividade totalmente encerrada e, por consequência, 44% disseram já ter despedido trabalhadores. Atualmente, os restaurantes já funcionam com limitação condicionada a um máximo de seis pessoas por mesa no interior e dez pessoas nas esplanadas.

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