O lado negro das eleições americanas

Joe Biden foi eleito o próximo presidente dos Estados Unidos da América. A notícia que o mundo queria. Não porque Biden é Biden, mas porque Biden não é Trump.

Por Kevin Santos

Não presenciámos mais que uma guerra pro-Trump VS anti-Trump. Uma triste realidade que espelha uma sociedade cada vez mais corrompida, cansada e gasta. Uma realidade que deve ser alvo de debate.

Vou ser sincero. Não percebo esta aura do espetacular que foi criada em volta desta derrota de Trump. Digo “derrota de Trump” e não “vitória de Biden”, porque é isso que interessa, pelo menos aos olhos de grande parte do mundo. E sim, é verdade que Trump perdeu, mas não foi o único. Nós também perdemos. Não porque Biden estará na Casa Branca nos próximos quatro anos (pelo menos), mas porque estas eleições não foram mais do que a confirmação do que se vai passando na nossa sociedade.

Donald Trump não só foi eleito em 2016, como, depois de quatro anos espetacularmente polémicos e palermas, conseguiu obter resultados fantásticos, na ótica dele (aterradores na minha), e assustar o mundo com a possibilidade de mais quatro anos no limbo (entre democracia e autocracia). Não há assim tantas razões para festejar. Estas eleições, apesar de terem o desfecho mais desejado, demonstraram que as eleições de 2016 não foram um equívoco. E isto é um problema grave, muito grave.

Mais grave ainda quando percebemos que não se trata de um ‘tumor benigno’ e que um processo de ‘metástase’, que promete levar esta ‘doença’ mundo fora, está em andamento. Não sei, ao certo, onde (re)começou este processo. Ou se alguma vez terá acabado. Mas a verdade é que este ‘cancro’ está por todo o lado e cabe aos cidadãos do mundo erradicá-lo, de uma vez por todas.

A sociedade está cada vez mais polarizada e aumentam as tensões, os extremismos, o racismo, a xenofobia, os fundamentalismos religiosos… Tudo à nossa volta. Não devemos apontar o dedo a quem vota em Trump, mas perceber que este é um problema muito maior que o polémico 45º presidente dos EUA.

O Brasil, por exemplo, é (des)governado por Jair Bolsonaro e vamos verificando um aumento da presença de extremistas e radicais nos governos europeus. A extrema-direita ficou entre as mais votadas nas eleições de vários países europeus, como Suécia, Áustria, Hungria, Holanda, Alemanha ou Suíça. Podem não vencer, mas a presença parlamentar tem vindo a aumentar exponencialmente. Na Itália, Matteo Salvini e o Lega Nord. Na França, Marine Le Pen e a Frente Nacional. Na Espanha, o VOX. E em Portugal, o Chega. Será que é este o mundo que queremos? Não aprendemos nada com a história?

Eu não percebo nada de política. Não tenho partido. Mas sou um cidadão e compreendo a frustração com algumas políticas e (des)governos democráticos. Muitos acreditam (ou são levados a crer) que está na hora de ‘dar um murro na mesa’. Até podem estar certos. Mas votar no Chega, e em todos os partidos extremistas pelo mundo fora, não passa por mais do que ‘dar um murro na própria cara’.

Os americanos aprenderam isto da pior forma, mas parecem apostados em recuperar o tempo perdido (fosse só o tempo…). A minha esperança é que os cidadãos do resto mundo tenham assistido à turbulência americana dos últimos quatro anos e que retirem algumas lições valiosas do longo e tumultuoso ‘episódio’ Trump.  

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